14/08/2011

Hell Xis


É fácil, organizar-se concertos em Portugal?

Digamos que fácil até poderá ser, prova disso é a quantidade de pessoas que os organizam. A parte difícil é fazer com que eles funcionem e que tenham alguma qualidade. Quando falo de qualidade refiro-me a um PA minimamente decente, a uma sala porreira, a boas condições para as bandas e, obviamente, para o publico.


Quando é que sentiram que isso era algo que queriam fazer?

Organizei o meu primeiro concerto ainda na escola. Fazia parte da Associação de Estudantes. Então eu, e outro rapaz que adorávamos metal, decidimos organizar um concerto na escola do Pragal em Almada. Devia ter os meus 14 anos.
O bichinho ficou, e apesar do meu tempo não ser muito, ao longo dos anos, ia fazendo um concerto quando surgia alguma oportunidade e disponibilidade. A partir de uma certa altura da minha vida fiquei com mais tempo disponível e fui contactado por uma agência para fazer alguns concertos por cá, isso começou a acontecer com regularidade e assim chegámos a este ponto.


Há muita inveja / mesquinhez nessa actividade?

Quando tens sucesso nas tuas opções de vida há sempre quem sinta inveja do que fazes e isso deve ser um catalisador para ti e deves aproveitar isso de uma forma positiva, visto que isso demonstra que o que fazes tem valor. Se não fosse esse o caso ninguém iria ter sentimentos desse género contigo.
Isto responde á tua pergunta? [responde pois!]


Vocês não se cingem à marcação de concertos, ditos, grandes, mas também organizam concertos mais pequenos. Sentem essa necessidade?

Tenho muito mais prazer em trabalhar em concertos que não se perca o feeling do que estás a fazer. Não ambiciono a fazer concertos com grandes bandas, para ver essas bandas compro o meu bilhete e vou assistir ao concerto com os amigos e família. Nos concertos ditos pequenos, com bandas ditas pequenas é que a magia por vezes acontece. É nesses concertos que consegues uma comunhão brutal entre o público e a banda e eu, como organizador, não me dissocio do papel de público, porque não marco bandas que não me digam nada. Logo, enquanto publico / fan acabo por sentir essa comunhão de uma forma especial porque consigo passar um dia inteiro com pessoas por quem tenho admiração e respeito pelo seu trabalho na música.
Já trabalhei em produções como tour manager ou simplesmente como merch guy ou loader e vejo promotores que nem sequer se cruzam com os músicos, seja por vontade própria dos promotores, seja porque o músico X ou Y não gosta de ser incomodado.
Enquanto organizador ou promotor não é isso que procuro. Gosto de me envolver, gosto de lá estar a fazer o que for preciso. Tanto vendo um bilhete na porta, como tiro uma imperial no bar, como carrego o merch e o backline das bandas ou estou lá em cima do palco durante o concerto todo a ajudar no stage dive e a fazer segurança ao backline a ver se ninguém parte nada e não se magoa.


Para alguém que não esteja tão acerca, descrevam-nos o processo de se organizar um concerto.

É um processo simples. À vontade de duas partes -promotor e banda -, junta-se a uma boa dose de irresponsabilidade financeira ou, como costumo dizer, “colocas a cabeça no cepo”; tentas fazer tudo da melhor maneira possível para que as bandas e o público tenham as melhores condições. Depois é esperar que os astros alinhem todos na mesma direcção e que tudo corra pelo melhor e que, ao fim da noite, não tenhas que ir ao multibanco levantar dinheiro porque o que fizeste na porta não chegou para as despesas.


Qual foi o vosso concerto preferido? (organizado por vocês, claro)

Sinceramente todos eles têm uma boa recordação por qualquer motivo. Mas obviamente que quando a banda que está a tocar te diz mais que outra podes inserir esse num dos concertos preferidos. Nesse caso destaco Agnostic Front em Corroios e no Music Box, especialmente o do Music Box. Terror ou Cro Mags em Cacilhas. DRI e Exploited também em Cacilhas. SOIA em Corroios… já são tantos.


E qual seria o vosso concerto de sonho?

Costumo dizer que a nível de bandas Hardcore para me sentir ainda mais feliz era conseguir trazer cá Hatebreed. Já cá vêem no fim deste mês, apesar de não ser eu a trazer, fico feliz na mesma e posso ver o concerto tranquilo. Outra banda que eu adorava ver, que pensei ser impossível ver mas que felizmente se reuniram, são os Blood For Blood. E, como te digo, para ser o meu concerto de sonho não preciso ser eu a organizar. Eles que venham que eu pago para ver, na boa.


Não havendo barreiras, ou limites, financeiras, o que é que fariam, dentro da cena hardcore?

Sem barreiras e limites? A tua pergunta dá a resposta, era mesmo sem limites!


Organizar concertos é algo que vos dá prazer? Quais são as melhores memórias que guardam? (contem-nos uma boa história)

Eu tinha 16 anos quando decidi não fazer nada que não me desse prazer a nível profissional. Isso aconteceu porque tinha cabelo comprido e o meu patrão na altura disse-me “ a partir de Janeiro tens que cortar o cabelo, isso é uma condição para continuares a trabalhar connosco”… eu não cortei o cabelo e pouco mais de um ano depois estava a abrir a minha loja e a começar a trabalhar para mim mesmo.
Fazer concertos sem ter prazer no que faço está completamente fora de questão, isso não quer dizer que não haja bastante sacrifício... há e de que maneira!
Todas as historias que eu possa contar, como boas recordações vão, inevitavelmente, ter às pessoas e às boas relações que tenho com elas. Se há 15 anos ou 20 me dissesses que me ia cruzar com o Roger Miret, depois de ter organizado 2 concertos com ele, e que ele me ia perguntar “então? Como vai a tua família?” e tratar o meu filho e a minha mulher pelos nomes eu ia achar isso uma coisa impossível. Se me dissessem que ia agarrar no Joe Hc e comer uma grande churrascada em Faro acharia pouco provável. Ter uma oferta assinada pelo Jon Josef dada em mão é uma honra. Como podes ver as minhas melhores memórias são as relações pessoais, e é isso que eu mais valorizo.


E projectos para o futuro?

No que toca a concertos com bandas estrangeiras vamos ver o que aparece e o que me parece possível organizar.
Quanto a lançamentos da Hell Xis Records, vamos ainda até ao final deste ano editar 2 ou 3 cd´s sendo, para já, possível informar que dois deles vão ser dos For Ophelia´s Death e dos Overcome.
A nível de agenciamento vamos continuar a fazer o melhor por todas as bandas com que trabalhamos e tentar dar-lhes saída a nível de concertos em Portugal e lá fora.


Algum concerto que possamos esperar? Alguma notícia em primeira mão que nos possam avançar?

Podem esperar tudo, mas também pode não acontecer nada.
Nós vamos fazendo as coisas dentro das nossas possibilidades e sem grandes planos. As coisas na Hell Xis surgem naturalmente; não ando na net a bater os sites de musica ou das agências para ver quem anda em tour, ou que bandas estão na moda para as trazer cá. Normalmente batem-me a porta e, se há condições para fazer as coisas, eu faço, se não houver condições, não arrisco. Como eu costumo dizer, concertos ainda organizo, cd´s também edito… milagres? Epá isso não consigo fazer!


Falem-nos da recente ideia de meter quatro bandas em tour pelo país...

É um desejo antigo. Quando vamos para a estrada com uma ou duas bandas, há sempre aquela parte do dia em que sentes que falta ali aquela ou a outra pessoa pelos mais diversos motivos. Esta tour pretende juntar um número considerável de bandas, compostas por pessoas maioritariamente amigas, que vão curtir muito estar juntas na estrada. Essas pessoas são componentes de muito boas bandas nacionais, que merecem uma coisa assim. Há espaço na musica nacional para ter uma tour só composta por bandas de cá. Há publico para isso. Talvez não tanto como gostaríamos, mas há. E, foi por isso, que juntámos 2 bandas hardcore com 2 bandas metal, para a coisa ser mais abrangente e poder ter mais sucesso.

O que falta, ao hardcore nacional?

Eu sei o que me faz falta a mim e tenho opinião própria sobre o que faz falta a algumas pessoas, mas não tenho pretensões e, até mesmo conhecimentos, para te dizer o que faz falta a um movimento ou a uma filosofia - como lhe queiras chamar -, à qual eu estou ligado principalmente pela música. Eu gosto de hardcore, música hardcore. Não me considero um “hardcore” nem me sinto à vontade para julgar o hardcore nacional como um todo a precisar disto ou daquilo.
A parte muito positiva que eu vejo no panorama português é a quantidade de grupos de pessoal que existem de norte a sul. E falo de grupos de pessoas, não de bandas. Desde Viana do Castelo, Porto, Gaia, Caldas da Rainha, Cadaval, Loures, Lisboa, Margem Sul, Faro e por aí adiante… Duvido que em muitos países haja gente tão dispersa a tentar fazer algo pelo HC como há por cá. Distribuidoras, zines, editoras, bookings temos de tudo um pouco. Há muito boa gente espalhada por aí a fazer algo por isto e a fazer as coisas acontecer meramente por amor à camisola.


É mais fácil organizar um concerto, ou editar um disco? O que preferem?

Na parte que me toca, diria que é mais fácil editar um álbum do que organizar um concerto. Mas não posso dissociar uma coisa da outra, porque as bandas com que trabalho a nível de edição, acabo sempre por trabalhar a nível dos concertos de lançamento, pelo menos. A Hell Xis não tem uma distribuidora a nível nacional, já tivemos e vimos que não era aquilo que queríamos. A vantagem de distribuíres a nível nacional é chegares a mais pessoas através de pontos de venda massivos, tipo Fnacs. O reverso da medalha é que tens que baixar o preço do CD para um valor ridículo e, se isso pelo menos tivesse como resultado o CD chegar ao público a bom preço, ainda entendia, mas tu baixas o preço na origem, única e exclusivamente, para eles aumentarem a sua margem de lucro e o CD acaba por chegar ao público bem mais caros do que são vendidos pelas bandas nos concertos ou nas lojas mais underground.
Isso ajuda as bandas a ficarem mais conhecidas, mas não sei se da forma mais correcta para criar uma base de fans que não sejam descartáveis.

Quanto à parte de preferir organizar ou editar, gosto das duas coisas, são actividades diferentes que me completam.


Há mercado para a venda de álbuns? Isto é, o hardcore vende bem, em Portugal?

Mercado há. Vender bem, não, não vende bem. E eu considero vender bem conseguir pagar as despesas de edição de um CD. Não estou a falar de vender milhares de discos.
Enquanto as pessoas não entenderem que comprar os CD´s ajuda a fazer a “máquina” andar, vai ser complicado ver edições a sair com mais frequência. Os gastos que uma banda tem em salas de ensaio, instrumentos, estúdios de gravação, edição, masterização, consomem muito mais dinheiro do que aquele que as bandas realizam em cachets ou em vendas de merch. Se as pessoas não compram o CD e se ele acabar por não se pagar a ele próprio, as bandas deixam de ter condições para gravar um segundo CD. Ou seja, a “máquina” para, a não ser que tenham uma vida desafogada com um bom background financeiro e que vás funcionando como mecenas da banda e faças as coisas andar sem teres que fazer contas à vida.
Estou plenamente consciente das dificuldades que existem a nível social para conseguir haver dinheiro para tudo, mas era muito importante as pessoas valorizarem o CD objecto e fazerem um esforço para o comprar mais vezes. É uma forma de apoio às editoras e às bandas. E teres o CD na mão, ver o book, apreciar o artwork, entender o conceito enquanto ouves a música, não é a mesma coisa que sacar a música da net e estar a ouvir enquanto jogas online a qualquer coisa, por exemplo.

Para quando edições frequentes em vinil? É um objectivo vosso?

Gostaria muito de conseguir fazer mais edições em vinil. No entanto, o vinil é de fabrico bem mais caro que o CD e, na hora de vender, tens que o vender a metade do preço de um CD. Ninguém te paga mais que 5 ou 6 euros por um 7 polegadas e, além disso, há menos consumidores de vinil porque a maioria do pessoal nem sequer tem prato em casa.
Fizemos uma edição em vinil e digamos que até agora nem o investimento recuperámos. Isso não nos faz desistir mas faz-nos rever as opções que temos para rentabilizar as coisas. A Hell Xis pode não lucrar mas a intenção é mesmo perder o menos possível para manter a actividade.


Sentem-se realizados? Ou o que falta para tal?

Desde que começámos a fazer concertos mais frequentemente, em 2005, já temos mais de uma centena de concertos realizados. Se considerar apenas os concertos Hell Xis, porque se considerar os agenciamentos ou as participações das nossas bandas em outros eventos, já lhes perdi a conta.
A nível de edições já vamos para a 16ª, a primeira foi em Março de 2007.
As amizades que fiz e as pessoas que conheci… acho que sim, sinto-me realizado. E acho que, gostem ou não, a Hell Xis deu um grande contributo ao meio underground nacional.
Mas atenção, falta-me sempre qualquer coisa, parar é morrer e no dia em que a Hell Xis achar que já fez tudo o que tinha para fazer, morre.


Deixo este espaço à vossa mercê para algo que queiram dizer, obrigado J

Aproveito apenas este espaço para vos agradecer esta oportunidade de falar sobre a Hell Xis e para divulgar o nosso site www.hellxis.com . O site não é actualizado com a frequência que gostaríamos mas para ficarem a par das novidades na hora também podem seguir o nosso facebook em HELL XIS ou HELL XIS AGENCY.

Não posso também deixar de agradecer a todas as pessoas que, de uma forma ou de outra, apoiam as nossas iniciativas, a todos os que gratuitamente ajudam e a todas as bandas que fazem parte ou fizeram parte da família Hell Xis… LIKE IT OR NOT!

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O 4THEKIDS quer agradecer ao Emanuel pela disponibilidade para a elaboração desta esntrevista e deseja à Hell Xis a maior sorte futura.

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