Estivemos à conversa com Paulo Lemos, autor do livro "Vida Suburbana" e também antigo vocalista e guitarrista da banda açoriana Resposta Simples.
Onde nasceu esta
ideia de escrever um livro sobre o punk em Portugal e como lhe deste forma?
Olá
pessoal e, antes de mais, muito obrigado pelo vosso apoio e pelo trabalho que
têm desenvolvido ao longo destes anos com o 4THEKIDS! A “Vida Suburbana”
encontra a sua génese na minha tese de mestrado de Estudos Artísticos, na
vertente de Estudos Musicais, da Universidade de Coimbra. Escrevi-a e defendi-a
há alguns anos, em 2011 para ser mais preciso, e há algum tempo a Associação
Cultural Burra de Milho mostrou-se interessada em editar a dissertação em
formato livro, visto esta ter sida a primeira tese sobre o punk em Portugal!
Assim sendo, a Burra de Milho realizou um trabalho fantástico, e trabalhámos
desta forma em conjunto no sentido de registarmos historicamente uma análise
académica e artística deste nosso movimento através da edição do “Vida
Suburbana”.
Como foi o processo de escrita do livro?
Sendo
a base do livro uma dissertação universitária, o processo de escrita passou por
um conjunto de regras académicas. Estas traduzem-se pela leitura de muitos
artigos e pela utilização de fontes de outros autores, para comprovar, ou
complementar, as ideias que ali defendo. Para além disso, a cargo da
recomendação dos meus orientadores, realizei primeiramente uma contextualização
ao punk internacional, passando posteriormente pelo movimento nacional e
terminando com o caso de estudo da banda punk nacional mais antiga no ativo, os
Mata-Ratos.
Em que te baseaste para a escrita e como foi a procura de informação?
Como a existência de bibliografia académica sobre o punk
português é praticamente inexistente (à exceção de alguns artigos pontuais
sobre determinados grupos ou épocas), tive que basear grande parte da minha
pesquisa em papers estrangeiros. Embora as minhas leituras tenham sido
complementadas com a leitura de livros como “25 anos de Veneno” e “Censurados
Até Morrer”, para além da “A Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX” e
“A Arte Eléctrica De Ser Português - 25 Anos de Rock'n Portugal”, procurei
analisar o punk de acordo com as ciências sociais da Sociologia, Antropologia e
Etnomusicologia.
Paulo Lemos, autor do livro "Vida Suburbana"
Na abordagem ao Punk internacional, de que bandas e que conteúdo podemos esperar?
Abordo o punk internacional de uma forma generalista e dou a
conhecer as suas ramificações posteriores. Início assim a sua história com o
“proto-punk” onde compreendemos a sua evolução para o conhecido “punk 77”. Para
os que desconhecem, e para aqueles que pretendem conhecer um pouco mais sobre
os cismas do punk, escrevo sobre as variadíssimas “way of life” do punk, mais
concretamente o Oi!, crust, anarco-punk, hardcore, new york city hardcore,
hardcore melódico, entre outros. A listagem de bandas é extensa pelo que
recomendo a leitura do livro [risos].
Que tipo de abordagem fazes aos Mata-Ratos?
Realizo uma análise biográfica, estética e lírica. Desta
forma, conto primeiramente a história dos Mata-Ratos, descortinando de seguida
aspectos como o significado do seu nome, estética e público presente nos seus
concertos. Para além disso, podemos também compreender o alinhamento da banda
com movimentos políticos e encontrar um padrão lírico nos seus álbuns. Por fim,
para além de uma análise gráfica às capas dos seus fonogramas, existem
variadíssimas reflexões sobre os Mata-Ratos e o seu percurso musical.
Miguel Newton, vocalista da mítica banda Mata-Ratos. Também foi o orientador e co-orientador da tese de mestrado que deu origem ao livro "Vida Suburbana"
Onde podemos comprar e qual o preço a que o livro estará disponível?
Numa primeira fase, já é possível encomendar o livro através
do Facebook da Associação Cultural Burra de Milho. De seguida, a editora encontra-se a trabalhar numa
distribuição mais extensa, a nível nacional, e nas próximas semanas o “Vida
Suburbana” encontrar-se-á à venda em Lisboa, Porto, Coimbra e Castelo Branco. O
preço é, na minha opinião, bastante DIY custando 7€ o exemplar. Para além
disso, é preciso notarmos que a Burra de Milho, para além de vestir o papel de editora,
é uma Associação Cultural sem fins lucrativos.
Sendo tu açoriano, podes falar-nos um pouco do movimento por aí?
O
punk açoriano já deu algumas cartadas valentes no panorama nacional! Já tivemos
a oportunidade de produzir concertos com Mata-Ratos, Freedoom, Pointing Finger,
Get Lost e Fitacola. Foi a primeira vez que estas bandas vieram aos Açores (era
então os longínquos anos de 2004 e 2005), num evento que eu e alguns amigos
produzíamos: Festival Acção Directa! Para além disso, criámos uma editora, a
Impulso Atlântico, e editámos grupos como os Resposta Simples,
Fora de Mão, Manifesto, para além da colectânea “Ataque Frontal”, entre outros. Claro que a vida
profissional e social leva-nos para outros caminhos e atualmente estes
projetos, à exceção de Manifesto, já não existem. Contudo, todos os membros
destes grupos, e muitos amigos meus, continuam nos dias hoje culturalmente muito
ativos produzindo muita arte na região, não se restringindo apenas ao punk
rock. Existem ainda alguns grupos punk terceirenses que continuam a
representar, como os Mufasa e agora os Abutre Suicida (ex-Punkrias). Para além
disso, a editora Anoise Recs encontra-se sedeada agora na Ilha
Terceira. Relativamente a São Miguel, esta Ilha sempre teve uma tradição metal
muito forte embora tenham existido alguns grupos punk como os Glicerina e
pop-punk como os Skillsaw 4am. Nas outras ilhas, também existem alguns registos
pontuais de agrupamentos musicais punk ao longo dos últimos anos.
Resta-nos agradecer ao Paulo pelo tempo que dispensou para nos dar esta entrevista.